16 de abr. de 2012

O “Sobrevivente” Esquecido do Titanic

Conforme temos sido relembrados incontáveis vezes ao longo das semanas passadas, há cem anos o “inafundável”Titanic afundou no Atlântico Norte, levando consigo mais de 1.500 vidas. A tragédia tornou-se tema de algumas históricas épicas.
De todas essas históricas, uma das mais extraordinárias é a de um persa de 68 anos de idade que, na verdade, não embarcou na malfadada nau, mas que o deveria ter feito.
Abbas Effendi – conhecido como 'Abdu'l-Bahá ou“o Servo de Deus” -- foi retratado pela imprensa tanto na Europa quanto nos Estados Unidos como um filósofo, um apóstolo da paz, até mesmo como o retorno de Cristo. Seus admiradores norte-americanos o haviam enviado milhares de dólares para que comprasse uma passagem para viajar no Titanic, e o imploraram que embarcasse com a maior opulência. Ele não aceitou e doou o dinheiro para ações de caridade.
"Convidaram-me para navegar à bordo do Titanic," ele disse depois, "mas este não era o desejo de meu coração."
Em vez disso, 'Abdu'l-Bahá navegou até Nova Iorque à bordo do SS Cedric, um navio mais modesto. Todos os grandes jornais de Nova Iorque cobriram sua chegada em 11 de abril e a sua subsequente caravana de oito meses pelo território estadunidense. Esse forasteiro de turbante, que usava “robes orientais” se tornou notícia de capa.
O New York Times reportouque sua missão era "acabar com os preconceitos... preconceitos de nacionalidade, de raça, de religião." O artigo também o citou diretamente: "É chegada a hora de a humanidade levantar o estandarte unidade da humanidade, a fim de que as fórmulas e superstições dogmáticas possam chegar ao fim."
Diversas vezes, a imprensa o chamou de profeta, especificamente de “profeta persa” (ah, as aliterações!). Uma chamada, logo após sua palestra na Universidade de Stanford, dizia: "Profeta Diz que Não é Profeta." 'Abdu'l-Bahá era na realidade o líder da então nascente Fé Bahá'í, apesar de consistentemente negar essa coisa de profeta.
Ele pregava a fé fundada por seu pai, Bahá'u'lláh, em meados de 1800, fundada na unidade de todas as religiões. À época, havia apenas umas poucas centenas de bahá'ís nos Estados Unidos; hoje são 150.000. Dia após dia, mês após mês, multidões por todo o país (muitas vezes aos milhares) se reuniam para ouvi-lo falar. Em sinagogas ele louvava a Cristo. Em igrejas, exaltava os ensinamentos de Mohammed. E por todas as suas viagens, sua companhia era buscada por pessoas influentes como Andrew Carnegie, Alexander Graham Bell e Kahlil Gibran.
Como foi que 'Abdu'l-Bahá veio a inspirar tantas pessoas – essa figura obscura do oriente que passara 40 e tantos anos aprisionado por causa de sua religião, que nunca frequentara a escola ou fora exposto à cultura do ocidente?
Suspeito que isso tenha algo a ver não apenas com o que ele disse, mas com o que ele fez. "Ele é o único homem no mundo que, ao redor de sua mesa de jantar, juntou persas, zoroastrianos, judeus, cristãos, maometanos”, [sic] escreveuKate Carew (a Liz Smith de seu tempo) ao New York Tribune. Mais à frente no artigo, ela descreveu a visita de 'Abdu'l-Bahá à Missão Bowery no Lower East Side – onde ele pessoalmente entregou moedas de prata a 400 desabrigados.
Durante toda a sua visita aos Estados Unidos, ele deixou de lado o protocolo da segregação, insistindo que todos os lugares em que falasse fossem abertos a pessoas de todas as raças. Não era algo que agradasse às multidões na época. No Great Northern Hotel na Rua 57 (onde agora se localiza o Parker Meridien), o gerente veementemente negou-se a permitir que os negros adentrassem o recinto.
"Se as pessoas virem uma pessoa de cor que seja entrando em meu hotel, nenhuma pessoa de respeito jamais colocará seus pés aqui novamente”, disse ele. Então, em vez do encontro no hotel, 'Abdu'l-Bahá decidiu organizar um banquetemulti-racial na casa de um de seus seguidores, no qual vários brancos serviram aos negros – uma atitude subversiva e até mesmo perigosa naqueles tempos.
Somente entre os seres humanos é que a cor da pele era causa de discórdia, 'Abdu'l-Bahá afirmoucerta vez. “Os animais, apesar do fato de serem desprovidos de razão e compreensão, não tornam as cores causa de conflito. Por que motivo deveria o homem, que possui razão, criar conflito?”
As palestras de 'Abdu'l-Bahá pungiam a plateia com uma simplicidade radical. E ainda assim, ele promoveu ideias com as quais os norte-americanos lutam até hoje, um século depois: a necessidade da verdadeira harmonia racial e igualdade de gênero; a eliminação de extremos de riqueza e pobreza; os perigos do nacionalismo desenfreado e da intolerância religiosa; e a insistência na busca independente pela verdade. Alguma dessas fichas caiu em 2012?
Sua missão de unidade, espalhada por toda a nação estadunidense há cem anos, deveria ser celebrada juntamente com as mensagens de Gandhi, do Dalai Lama e de Martin Luther King Jr.
Em sua primeira palestra pública nos Estados Unidos – na Igreja da Ascensão de Nova Iorque, na 5ª Avenida com a Rua 10 – 'Abdu'l-Bahá estimulou o progresso material da América do Norte nas artes, na agricultura e no comércio, mas com o cuidado de também desenvolvermos nossas potencialidades espirituais.
“Pois o homem necessita de duas asas. Uma asa é o poder físico e a civilização material; a outra é p poder espiritual e a civilização divina. Somente com uma asa, o vôo torna-se impossível.”
Ele deu essa palestra em 14 de abril de 1912. Mais tarde nesse mesmo dia, o Titanic atingiu o iceberg.
Fonte: Postado por Secretaria Nacional de Ações com a Sociedade e o Governo - SASG

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